quarta-feira, 16 de janeiro de 2008

A febre, a crise e a gestão por resultados

É bem possível que alguns mal-intencionados possam, num futuro próximo, atribuir o propalado risco de uma epidemia de febre amarela à falta de recursos do setor. "Bem que avisamos que a CPMF ia fazer falta", dirão eles.

A falta de investimentos na infra-estrutura de saúde pública do país é de longa data, e antecede em muito a criação e a extinção da CPMF. É óbvio que a escassez de vacinas, de medicamentos, de leitos nos hospitais, de profissionais especializados decorre, em grande parte, da falta de investimentos financeiros na saúde, e de verbas de custeio compatíveis com as necessidades da população. Não há dúvida alguma que falta dinheiro, e falta muito. Mas, pouco adiantará a geração de novos impostos para aumentar a receita do Estado se não houver como controlar a utilização dos recursos, hoje administrados pelo exercício de péssimas gestões.

A falta de gestão na saúde está à mostra para quem quiser ver. Assistimos, nos últimos anos e décadas, o surgimento de epidemias como a dengue, por exemplo, que já se tornou endêmica. Agora, outra ameaça ronda os rincões do país, com a temida volta da febre amarela urbana, que em sua versão silvestre parece ser responsável por pelo menos duas das mortes recentes.

Assustadas e inseguras diante das políticas públicas de combate a epidemias, as pessoas correram aos postos de saúde em busca de vacinação na semana passada. Muitas sequer iriam viajar para áreas de risco, outras tantas ainda estavam imunizadas - uma vez que a vacina da febre amarela vale por 10 anos. No entanto, pouco importava. Filas foram formadas às cinco horas da manhã nos postos de saúde do Rio. Quem chegava um pouco mais tarde recebia a notícia de que as doses estavam esgotadas. E apesar do alerta público das autoridades sanitárias sobre a ausência de motivo para pânico, as pessoas continuaram a fazer filas nos postos, com medo de uma epidemia de febre amarela.

São duas as constatações após este episódio: o governo não está pronto para situações de emergência, e a população está completamente desinformada. A impressão é que as pessoas não acreditam nas ações ou orientações do governo, porque constatam a todo o momento que o mesmo governo que orienta e vai à TV acalmar a população trabalha sem qualquer planejamento focado em resultados. Daqui pra frente, será preciso trabalhar para encontrar as causas de tão pouca credibilidade.

O Brasil é tão grande, e sua máquina pública tão complexa, que talvez esteja na hora de adotar aqui o que já funciona na Austrália e está sendo proposto na França: a implantação de controles externos sobre os programas ministeriais. Feito através de auditorias independentes que acompanham as políticas públicas e as ações tomadas pelos seus gestores, o acompanhamento externo consegue medir os resultados e avaliar o desempenho dos ministros e seus subordinados, utilizando-se de metas e indicadores de desempenho publicamente conhecidos. Simples assim: os ministros e os gestores públicos definem o que vão fazer e que metas querem atingir, e as empresas auditoras acompanham o cumprimento dessas metas. Implacáveis, as auditorias incluem um contrato de gestão focado em resultados e a demissão sumária dos incompetentes.

Aí sim, é bem possível que, num futuro próximo, os bem-intencionados sejam exitosos. E que a população brasileira não se incomode mais em pagar novos ou velhos impostos - que hoje representam o equivalente a quase 120 dias de trabalho por ano - para o custeio dessa nova organização social, eficaz em seus controles. E que o gestor público tenha de volta a boa reputação que um dia foi possuidor.

Josier M. Vilar é médico e Presidente do SINDHRIO

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